Hoje vinha no autocarro da rede da madrugada e lembrei-me de nós.
Estava um rapaz a amparar a cabeça da rapariga que dormia encostada ao ombro dele, claramente tendo bebido demais. A rapariga dormia e o rapaz amparava-a, resguardando-a do barulho e dos meliantes em volta.
Era tão simples e era só isto, e num movimento simples eu lembrei-me de nós sem saber porquê.
Lembrei-me de uma memória futura de nós em Edimburgo, numa rua cinzenta igual a tantas outras, debaixo de uma morrinha fria e antipática. Nós sentados na Praça do Município feita à medida para nós, e tu a contares-me da maneira mais fofinha e carinhosa da cicatriz que tens no dedo e que nunca mais te deixou tocar guitarra como dantes. Nós na Rua da Prata a ver as montras e os teus dedos nos meus cabelos e o meu nariz no teu pescoço e a desejarmos que a vida parasse para sempre naquela madrugada citadina e que para sempre fosse a tua boca na minha, os meus dedos nos teus cabelos e o teu nariz no meu pescoço, sempre, sempre, sempre.
O autocarro parou na minha rua, os namorados seguiram viagem. Olho-te. Tu continuas a secar no teu Verão, e eu a apodrecer na minha longa estação de ninguém.
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