sexta-feira, 14 de maio de 2010

A incomunicabilidade

- Olá!
- Olá, como estás tu?
- Olha, por acaso...
- Isso é óptimo. Eu também. Aliás, no outro dia aconteceu-me uma coisa muito gira...
- Ah, a mim também.
- Ia a passar pela Baixa e há uma mulher que deixa cair um papel. Eu por educação vou lá e apanho, e antes de lho devolver reparo que era um desenho, uma espécie de peixes assim esquisitos...
- Eu adoro Radiohead, e tu?
- Hã?
- Weird fishes, pensei que... Mas desculpa, estavas a dizer?
- Ah, não era nada, era só que o desenho era mesmo bonito, e depois a mulher agradeceu e foi-se embora e eu fiquei a pensar que aquilo me lembrava um filme que vi uma vez...
- Eu vi um filme muito giro ontem. Tinha que ver com a infância e as simbologias e aquilo que nos faz querer o que queremos. Sabes? O que está na génese, a génese do desejo, pode dizer-se assim. Porque no fundo somos todos vontade...
- Sim, sim, no filme também havia uma cena assim. O homem tinha uma obsessão por quadros, mas isso não era o principal, o interessante é que o homem depois ia numa viagem, pela América e isso, e às tantas chegava à conclusão de que estava sempre sozinho, mas sozinho mesmo, sabes, como...
- A vontade, é uma coisa importante, estás a ver, eu penso muito sobre isso, a vontade e o seu contrário, afinal o que é isso de querer, já pensaste? O desejo leva à acção, a acção leva a uma consequência, e no meio disto tudo...
- Pois, ele estava sozinho e questionava-se, entendes, e a verdade é que muitas vezes quando pensamos nisto estamos a partir de pressupostos errados, sabes? Eu não acredito nessa coisa do Eu, o Eu em relação, o outro que -
- Porque a vontade determina-nos, a nossa essência, se for como diz o outro, e depois no fundo tudo é -
- O que importa realmente é a consciência, e isso não -
- Vontade de -
- Isso é lindo.

- Tens uns olhos incríveis. Bora para a cama?
- Bora.

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