terça-feira, 11 de maio de 2010

Understudy

Tomás, que é alto e tem um charme meio junkie existencialista, gosta do Sartre mas prefere A Queda, fuma cigarros de enrolar e tem dedos compridos de pianista. Mas não toca, gosta mais de escrever, claro, e também desenha. Não tem uma vespa e um fato italiano mas gosta de alfarrabistas e tem um comercial a diesel, o que já não é nada mau. O sentido de humor é desarmante mas dorido (será desarmante por isso?) - ele disse-me que não tinha um blogue mas tem, e eu vi. A nossa relação começou, portanto, com uma mentira. Mas eu sou uma esbelta enfermeira da II Guerra, e - tal qual como o Camus diz - penso sempre ter êxito naquilo em que os outros falharam. Oh, ele falar-me-á dos manifestos discretos de Nabokov pela noite dentro, regada a vinho branco num restaurante ilegal dirigido por imigrantes na nossa Lisboa pombalina. Ele não acredita no teatro e justifica-se e eu tento convencê-lo, mas ele argumenta tão bem e tão articuladamente - Tomás, o empedernido, tem palavras que me fariam acreditar no que quer que fosse.
Tomás tem uma sala de estar empoeirada, com chão de tábuas velhas e uma média-luz convidativa. O cheiro dos livros amontoados em cima de caixotes contrasta com o perfume das frésias que ele arranjou de surpresa porque sabia que eu estava a chegar. Uma jarra improvisada, dois copos em cima do tapete, o cinzeiro moderno a abarrotar de beatas e fios de conversa. Podia ser feliz aqui, pensaria eu.



"o amor também não existe apenas para ser sentido"

Pois não.

2 comentários:

Niusha disse...

telefonez a moi, oui, ma cher soeur?

Nada disse...

E acabará com a própria vida num belo dia de sol, numa praia isolada. Sem cartas, sem culpas ou acusações. Em silêncio e em paz consigo mesmo, sabendo desde antes que está destinado à eterna admiração, que a sua náusea será lida e invejada por aqueles que sequiosos de significado buscam por leituras que alimentem o pretensiosismo.

Ou então vive e engorda, perde a charmosa paciência e torna-se fogo fátuo enclausurado numa moradia insípida onde os momentos fazem com que exaspere, sentido muito ao de leve durante brevíssimos instantes que rapidamente entram em ebulição, que perdeu algo muito bom - neste último caso escreve inúmeras cartas de despedida, de culpabilização, mas nunca se mata.